Agostinho de Hipona
“Crê para entender, e entende para crer com
firmeza; sem compreensão, a fé se torna frágil.”
Tomás de Aquino
“A razão e a fé são irmãs que caminham juntas: a
mente que busca entender glorifica ao Criador tanto quanto o coração que o ama.”
A. W. Tozer
“Uma adoração que não envolve a mente acaba em
cantoria vazia; Deus deseja nossa inteligência dedicada, não apenas nossos
lábios.”
Martim Lutero
“A verdadeira teologia começa quando nos
prostramos diante da cruz e, ao contemplá-la, nosso entendimento e amor por
Cristo se aprofundam.”
C. S. Lewis
“Não creio em fé cega; acredito em um salto
fundamentado na razão e na beleza da verdade que glorifica a Deus.”
John Piper
“Deus é mais glorificado em nós quando nossa
alegria em compreendê‑Lo é tão forte quanto nosso desejo de servi‑Lo.”
Vivemos dias em que a simplicidade é exaltada como virtude máxima da
espiritualidade. E, de fato, o Senhor Jesus se alegra na fé simples, pura e
rendida — “Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos
fizerdes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus” (Mateus
18.3) — e — “Temo, porém, que, como a serpente enganou a Eva pelo seu astuto
artifício, assim também vos sejam corrompidos os vossos sentidos, e vos
desvieis da simplicidade que há em Cristo” (2 Coríntios 11.3) . Mas
simplicidade não é sinônimo de ignorância, nem fé sincera é inimiga do
conhecimento. A Palavra de Deus nunca propôs uma espiritualidade desinformada,
mas uma espiritualidade iluminada — uma fé que pensa, que discerne, que
consola, que resiste e que anuncia com clareza e poder.
A teologia, longe de ser luxo acadêmico ou debate estéril, é um serviço
de amor. É a busca por entender melhor o Deus que nos amou primeiro, para que
possamos amá‑Lo com mais profundidade e servir ao próximo com mais precisão.
Como escreveu Anselmo de Cantuária: “Fides quaerens intellectum” — a fé
busca o entendimento. O verdadeiro conhecimento de Deus gera humildade, não
vaidade — pois “no que diz respeito às coisas sacrificadas aos ídolos,
sabemos que ‘temos conhecimento’, mas o conhecimento incha; e se alguém supõe
saber alguma coisa, ainda não sabe como convém saber; mas, se alguém ama a
Deus, esse é conhecido d’Ele” (1 Coríntios 8.1‑3). Ele consola, não
complica. Ele cura, não fere.
Cornélio, o Centurião — Fé Sincera, Mas Incompleta
Cornélio é um exemplo emblemático de fé sincera e genuína, mas que
carece de um entendimento pleno da verdade revelada em Cristo. Ele era um homem
temente a Deus, piedoso, e de grande generosidade, características que não
apenas definem o seu caráter, mas também a sua relação com o Senhor. O texto de
Atos 10.1-2 descreve: “Havia em Cesaréia um homem chamado Cornélio,
centurião da coorte chamada Italiana, servo de grande prestígio entre toda a
plebe judaica. Ele, que era temente a Deus, bem como toda a sua família,
praticava muitas esmolas ao povo e orava a Deus continuamente.” Cornélio,
embora não fosse um judeu por nascimento, se dedicava à prática religiosa e
demonstrava uma sensibilidade espiritual rara, que o tornava digno da atenção
divina. Ele não apenas orava, mas sua vida era marcada por um comprometimento
constante com os pobres, evidenciando uma sinceridade em sua devoção, que
ultrapassava as barreiras de um simples formalismo religioso.
Contudo, a sua fé, apesar de sólida e verdadeira, não estava completa.
Ele carecia do conhecimento essencial da salvação plena, que só poderia ser
encontrada em Cristo Jesus. Sua sincera busca por Deus, embora notável, ainda
não o havia levado a uma compreensão plena da obra redentora de Cristo. Foi
então que, em sua humildade e desejo de seguir a Deus de forma verdadeira, ele
recebeu a visita de um anjo. O mensageiro celestial, como registrado em Atos
10.4-6, disse-lhe: “Fitando-o atentamente, com temor, disse-lhe: Que é,
Senhor? Ele respondeu: As tuas orações e as tuas esmolas subiram para memória
diante de Deus. Envia, agora, a Jope e faz vir um Simão, chamado Pedro. Ele
ficará hospedado na casa de Simão, o curtidor, cujo alpendre se situa junto ao
mar.”
Este encontro não foi um simples sinal de que sua fé estava sendo
reconhecida, mas uma convocação para algo mais profundo e transformador. Deus
não desconsiderou a fé de Cornélio, mas lhe concedeu uma revelação maior,
convidando-o a conhecer a verdade mais completa que só poderia ser encontrada
na mensagem do evangelho de Cristo. Através da instrução de Pedro, que foi
enviado de Jope, Cornélio seria elevado a um novo nível de compreensão. Ao
ouvir a Palavra pregada por Pedro, a fé de Cornélio e de sua família foi
transformada. Não apenas uma adesão intelectual, mas uma experiência vivencial
do Espírito Santo, que os batizou, consolidando-os não apenas como crentes, mas
como missionários, transformando sua devoção em um chamado para a missão.
O exemplo de Cornélio nos ensina que a fé sincera, por mais autêntica
que seja, precisa ser acompanhada de revelação e ensino da verdade integral. A
devoção pura, que se expressa através das boas obras e da oração contínua, tem
seu valor, mas não está completa sem o entendimento de quem é Cristo e qual a
obra de salvação que Ele realiza. A fé de Cornélio foi ampliada, sendo guiada
pela Palavra que traz clareza doutrinária e, mais importante, pela presença do
Espírito Santo, que torna a fé viva e eficaz. Assim, a devoção se transforma em
missão, e a missão, por sua vez, se torna a realização do propósito de Deus
para a vida do crente. A história de Cornélio é, portanto, um convite para
todos nós: não basta ser temente a Deus de forma vaga ou incerta; devemos
buscar a verdade revelada em Cristo para que a nossa fé seja não só sincera,
mas também plena e transformadora.
Teologia: Escudo Contra os Lobos
Nos dias atuais, o zelo sem entendimento tem sido porta de entrada para
todo tipo de distorção, pois “porque conheço o zelo deles, mas não com
entendimento” (Romanos 10.2) expõe o perigo de uma fé entusiasmada,
porém desarmada.
O apóstolo Paulo, ao despedir‑se dos presbíteros de Éfeso, advertiu com
lágrimas: “Eu sei que, depois que eu sair, entrarão no meio de vós lobos
cruéis, que não pouparão o rebanho” (Atos 20.29). Essa advertência
escancara a vulnerabilidade de uma comunidade sem a armadura da doutrina.
Mas o antídoto está logo em seguida: “Agora, irmãos, confio‑vos a
Deus e à palavra da sua graça, que é poderosa para edificar-vos e dar‑vos
herança entre todos os santificados” (Atos 20.32). A graça revelada
na Escritura não apenas consola, mas também constrói e preserva o rebanho.
Sem conhecimento fiel da Escritura — pois “o meu povo foi destruído
por falta de conhecimento; visto que tu rejeitaste o conhecimento, também eu te
rejeitarei” (Oséias 4.6) — não há proteção contra o engano. A
teologia, portanto, não é luxo acadêmico, mas escudo divino, capaz de repelir
as investidas do erro e manter o povo de Deus firme no fundamento da Palavra.
A Teologia Submissa e Serena
A teologia que propomos não é a dos debates ostentatórios, nem a dos
sistemas fechados sobre si mesmos, mas aquela que se curva reverente diante da
revelação, como Moisés diante da sarça ardente. É um saber que nasce do
silêncio de quem busca ouvir a voz de Deus antes de formular respostas
audaciosas. Essa atitude se expressa em oração constante, serviço humilde e disposição
para aprender — características do discipulado que honra a Cristo, Mestre e
Senhor.
Tal teologia reconhece, acima de tudo, o caráter soberano e gratuito da
Palavra. “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a
repreensão, para a correção e para a educação na justiça”
(2 Timóteo 3.16), e não um manancial de armas doutrinárias para
vencer discussões. Assim, ela tem por objetivo “aperfeiçoar o homem de Deus,
para toda boa obra”, conforme “o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente
habilitado para toda boa obra” (2 Timóteo 3.17), e não inflar o
ego de ninguém.
Essa teologia encontra respaldo na humildade de Cristo, que “não
considerou que o ser igual a Deus era algo a que devesse apegar‑se, mas
esvaziou‑se a si mesmo” (Filipenses 2.6‑7), e no caráter pacífico e
sábio do Espírito, em quem “a sabedoria que vem do alto é, antes de tudo, pura;
depois, pacífica, moderada, tratável, cheia de misericórdia” (Tiago 3.17).
Ela vai além do mero acúmulo de informações: transforma o caráter, gera frutos
de justiça e capacita a igreja a servir com compaixão e firmeza.
Finalmente, essa teologia mantém-se vigilante contra o orgulho que
corrompe o conhecimento. Como admoesta “Deus resiste aos soberbos, mas dá
graça aos humildes” (Tiago 4.6), ela floresce na dependência do Senhor
e no reconhecimento de que todo avanço espiritual provém da graça. Eis, pois, a
teologia submissa e serena: um caminho de reverência inabalável e confiança
alegre na Palavra que nos molda e nos envia.
Chamado ao Aprofundamento
Portanto, simplificar é nobre quando remove o excesso humano, quando a
complexidade das ideias é desnudada, deixando apenas o essencial, aquele que
leva à verdade e à prática viva. No entanto, empobrecer a fé por medo do
conhecimento é uma armadilha sutil, que pode facilmente desviar a alma do
verdadeiro propósito da revelação divina. A fé cristã, longe de ser algo
superficial ou ignorante, é um convite ao conhecimento profundo, revelado e
transformador. Não estamos chamados a uma devoção vazia, mas a uma fé que
cresce na compreensão e amadurece na santidade. O Senhor deseja que o Seu povo
O conheça de forma completa e profunda: “Conheçamos e prossigamos em
conhecer ao Senhor; como a alva, a sua vinda é certa; e Ele descerá sobre nós
como chuva serôdia que rega a terra” (Oséias 6.3).
Este é o conhecimento que vai além do simples entendimento acadêmico; é
um conhecimento que transforma, que santifica, que envia. Não é um saber
desprovido de alma, mas uma teologia que leva à adoração e ao serviço. Ele não
se contenta em ser uma teoria distante da vida cotidiana, mas exige que, tanto
a mente quanto o coração, se entreguem ao Senhor. O conhecimento bíblico
verdadeiro não cria uma divisão artificial entre razão e emoção, mas consagra
ambas, unindo-as em uma devoção integral ao altar de Deus. É uma teologia que
não é meramente informativa, mas profundamente formativa e vivificadora.
É hora de buscarmos, com humildade e reverência, esse tipo de
conhecimento — não para nos colocarmos acima dos outros, nem para sermos fontes
de orgulho intelectual, mas para sermos instrumentos mais úteis nas mãos do
nosso Mestre. O conhecimento que Deus deseja nos conceder não é para alimentar
nossa vaidade, mas para nos capacitar a servir com eficácia no Reino. Como
disse Paulo a Timóteo: “Medita estas coisas; dá-te inteiramente a elas, para
que o teu aproveitamento seja manifesto a todos” (1 Timóteo 4.15). Este é o
tipo de dedicação que resulta em uma transformação visível na vida do crente,
fazendo de cada ação e palavra um reflexo da santidade e do poder de Deus.
Assim, o conhecimento em Cristo não é apenas uma busca intelectual, mas uma busca que envolve toda a nossa vida, orientando nossa prática, motivando nosso serviço e aprofundando nossa adoração. Este é o verdadeiro conhecimento que liberta, que nos leva a um viver que é digno da vocação celestial, e que se manifesta em tudo o que fazemos.