Por Jânsen Leiros
"O
meio é a mensagem." - Marshall McLuhan – Understanding Media: The Extensions of Man (1964); McLuhan
enfatiza que os meios de comunicação, como a mídia, não são apenas canais
neutros de transmissão de informação, mas moldam a própria natureza das
mensagens que carregam. Ele reconhece o impacto profundo da mídia na formação
das ideias e como ela altera nossa percepção da realidade, o que se alinha com
a ideia de que a mídia influencia de maneira substancial a compreensão
teológica e religiosa.
"A ascensão da mídia digital e das comunicações instantâneas
permite que ideias religiosas, tanto ortodoxas quanto heréticas, se espalhem
com uma velocidade sem precedentes." - Alister McGrath – The Twilight of Atheism (2004); McGrath analisa a
interação entre mídia e religião, destacando como a internet e outras formas de
mídia digital moldam a maneira como as pessoas acessam e interpretam conteúdos
religiosos. Essa citação corrobora a ideia de que a proliferação de
informações, muitas vezes superficiais, pode distorcer doutrinas e criar uma
compreensão fragmentada da fé.
"A comunicação pública, especialmente na era digital, muitas vezes
perde a capacidade de promover um diálogo genuíno e reflexivo, sendo
frequentemente substituída por informações simplificadas e
sensacionalistas." - Jürgen
Habermas – The Theory of Communicative Action (1981); Habermas argumenta sobre
o papel crucial da comunicação para a formação da opinião pública, mas também
aponta os riscos da comunicação superficial que prevalece nas mídias
contemporâneas, um ponto que está em consonância com a crítica à
superficialidade da informação religiosa na mídia.
"O desafio contemporâneo para o cristianismo é como transmitir a
verdade eterna em um mundo de informação instantânea e transformada." - John Stott – The
Contemporary Christian (1992); Stott destaca as dificuldades enfrentadas pelas
tradições religiosas em manter a profundidade e a autenticidade diante da
aceleração da troca de informações e da superficialidade das mensagens
midiáticas. Ele sugere que a fé precisa resistir à tentação de ser reduzida a
um produto de consumo rápido.
"A internet, ao democratizar o acesso à informação, ao mesmo tempo
facilita a propagação de ideias errôneas e a criação de bolhas
ideológicas." - Yuval Noah
Harari – 21 Lessons for the 21st Century (2018); Harari argumenta sobre os
efeitos da internet na formação de bolhas ideológicas e a disseminação de
desinformação, um fenômeno que também se aplica ao campo religioso, conforme
discutido no texto abaixo, onde a mídia digital pode facilitar a proliferação
de ideias errôneas ou incompletas sobre a fé.
Há algum tempo, venho acompanhando com apreensão a disseminação, pela
mídia, de conteúdos religiosos – e, em especial, de materiais que se apresentam
como cristãos e teológicos. Não é que eu questione a legitimidade do uso da
mídia para divulgar temas desse campo; pelo contrário, reconheço seu potencial
em difundir valores espirituais e conhecimentos sobre a fé. No entanto, minha
preocupação recai sobre o modo como esses conteúdos têm sido veiculados, muitas
vezes promovendo afirmações questionáveis e compreensões passíveis de debate
A mídia, com seu poder de moldar a opinião pública e disseminar
informações em tempo real, exerce uma influência cada vez mais significativa na
compreensão teológica contemporânea. A facilidade de acesso a conteúdos religiosos
através de diversas plataformas digitais democratizou a busca por conhecimento
espiritual, oferecendo aos indivíduos a oportunidade de explorar diferentes
perspectivas e interpretações das escrituras sagradas.
No entanto, a proliferação de informações, muitas vezes fragmentadas e
superficiais, também apresenta desafios. A busca por audiência e o impulso de
simplificar conceitos complexos acabam distorcendo doutrinas e disseminando
ideias equivocadas. A mídia, ao transformar a fé em um produto de consumo,
incorre no risco de banalizar o sagrado e reduzir a espiritualidade a uma mera
experiência emocional.
A influência da mídia na religião não é um fenômeno recente. Ao longo da
história, as diferentes mídias disponíveis em cada época – da imprensa escrita
ao rádio e à televisão – moldaram e, muitas vezes, instrumentalizaram a
compreensão e a prática religiosa para servir a objetivos específicos. A
Reforma Protestante, por exemplo, foi impulsionada pela invenção da imprensa,
que permitiu a disseminação rápida das ideias de Lutero.
Na era digital, a influência da mídia se intensifica. As redes sociais,
os blogs e os podcasts oferecem plataformas para a produção e disseminação de
conteúdos religiosos por parte de indivíduos e grupos. Essa democratização da
informação, embora superficial, permite um diálogo mais amplo e diversificado
sobre questões de fé. Por outro lado, ela também facilita a propagação de
informações falsas e impulsiona a formação de bolhas ideológicas que reforçam
visões estreitas, prejudicando o diálogo genuíno entre diferentes perspectivas
religiosas.
Para além dos aspectos negativos, a mídia também pode ser uma ferramenta
poderosa para a promoção do diálogo inter-religioso e da compreensão mútua.
Programas de TV, documentários e filmes podem apresentar as diferentes
tradições religiosas de forma respeitosa e informativa, contribuindo para a
construção de uma sociedade mais plural e tolerante.
É fundamental que os indivíduos desenvolvam um senso crítico aguçado
para discernir as fontes confiáveis e construir uma compreensão teológica
sólida e fundamentada. A leitura aprofundada de textos teológicos clássicos, a
participação em comunidades religiosas e o diálogo com especialistas são
elementos essenciais para uma compreensão teológica sólida, especialmente em um
cenário onde a mídia, em grande parte, prioriza conteúdos emocionais e
superficiais em detrimento da profundidade e da autenticidade espirituais. Além
disso, a mídia pode ser utilizada como uma ferramenta para o diálogo inter-religioso
e o aprofundamento da compreensão das diferentes tradições religiosas.
Este é apenas o início de uma jornada mais profunda sobre o impacto da
mídia na nossa compreensão da fé e da teologia. Ao longo das próximas semanas,
exploraremos com mais detalhes como a mídia tem transformado a prática
religiosa, as distorções que ocorrem ao simplificar doutrinas complexas e a
necessidade de uma reflexão crítica sobre as informações que consumimos. Com
isso, buscaremos não apenas compreender melhor esses fenômenos, mas também
sugerir caminhos para uma prática cristã mais sólida e fundamentada, que
resista às pressões da superficialidade e da comercialização do sagrado.